
Toxoplasmose: Doença do gato que ainda é mal compreendida
A toxoplasmose é um dos temas mais mal compreendidos quando se trata da relação entre gatos e humanos. É também uma das causas de abandono de gatos no Brasil, especialmente quando uma mulher engravida e é mal orientada sobre os verdadeiros riscos. Por isso, este artigo visa esclarecer de forma profunda e científica o que é toxoplasmose, suas formas de transmissão, os sintomas em gatos, e responder às perguntas mais comuns como “todo gato tem toxoplasmose?”. Tudo isso com o cuidado e a responsabilidade que um tema como esse exige.
O que é toxoplasmose?
A toxoplasmose é uma zoonose, ou seja, uma doença que pode ser transmitida dos animais para os seres humanos. Ela é causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, um parasita intracelular que tem como hospedeiro definitivo os felinos, especialmente os gatos domésticos (Felis catus). Isso significa que é no intestino dos felinos que o protozoário completa seu ciclo reprodutivo.
Porém, o que poucos sabem é que os gatos só eliminam os oocistos (forma infectante do parasita) nas fezes por um curto período: de 1 a 3 semanas após a infecção primária. Depois disso, mesmo que o gato seja reinfectado, dificilmente ele voltará a eliminar oocistos em quantidades significativas. Isso derruba o mito de que o gato é um “transmissor constante” da toxoplasmose.
Todo gato tem toxoplasmose?
Não. De forma alguma podemos afirmar que todo gato tem toxoplasmose. Um estudo do Centers for Disease Control and Prevention (CDC, EUA) aponta que a prevalência de infecção por T. gondii em gatos varia entre 30% e 40%, dependendo da região e dos hábitos do animal. Gatos que vivem em ambientes internos, com alimentação controlada (sem acesso a carne crua ou presas), têm risco mínimo de infecção.
Para que um gato seja fonte de contaminação, ele precisa:
- Estar infectado pela primeira vez;
- Estar no período de eliminação dos oocistos;
- Defecar em local com condições ambientais ideais para a esporulação (oxigênio e umidade);
- Ter suas fezes manipuladas por humanos que não lavem as mãos.
O risco é, portanto, extremamente baixo quando há higiene básica e cuidados com a limpeza da caixa de areia. Segundo Dubey (2016), o oocisto não é imediatamente infeccioso ao ser eliminado. Ele precisa de 24 a 48 horas no ambiente para esporular e se tornar capaz de causar a doença.
Portanto, limpar a caixa de areia diariamente já elimina praticamente todo o risco de contaminação.
Formas de transmissão da toxoplasmose
A transmissão da toxoplasmose pode ocorrer de diferentes maneiras. Para os humanos, as principais vias são:
- Ingestão de oocistos esporulados presentes em alimentos mal lavados (frutas, verduras, legumes contaminados com fezes de gatos infectados);
- Ingestão de carne crua ou malcozida, principalmente carne de porco, carneiro e boi contaminados com cistos do parasita;
- Contaminação cruzada na cozinha, ao manipular alimentos contaminados;
- Transmissão vertical da mãe para o feto durante a gravidez, se a mãe for infectada pela primeira vez nesse período;
- Transfusão de sangue ou transplante de órgãos (mais raro).
Portanto, o contato direto com gatos é uma das formas menos comuns de transmissão. Segundo a World Health Organization (WHO, 2022), mais de 60% das infecções em humanos ocorrem por meio do consumo de carne malcozida ou alimentos contaminados com o solo.
Nos gatos, a infecção geralmente ocorre quando o animal ingere carne crua ou pequenos roedores infectados. Gatos que não têm acesso à rua, a presas e a carne crua têm risco quase nulo de se infectar.
Sintoma de toxoplasmose em gatos
Muitos gatos infectados permanecem assintomáticos, ou seja, não desenvolvem sinais clínicos. Por isso, é comum que a doença passe despercebida.
Porém, em casos em que o sistema imunológico do animal está comprometido (como em gatos com FIV ou FeLV), a toxoplasmose pode provocar síntomas como:
- Febre persistente
- Letargia e prostração
- Perda de apetite (anorexia)
- Dificuldade respiratória
- Vômitos e diarreia
- Icterícia (mucosas amareladas)
- Tremores, convulsões ou incoordenação motora (sintomas neurológicos)
Esses sinais podem ser confundidos com diversas outras doenças. Por isso, o diagnóstico laboratorial é essencial. Na SOS Peludos, utilizamos sorologia (IgM e IgG), PCR e exames complementares para confirmar o quadro.
Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico pode ser feito por meio de exames sorológicos que identificam a presença de anticorpos contra o T. gondii. A presença de IgM indica infecção recente, enquanto IgG mostra exposição antiga.
Quando sintomático, o tratamento é feito com combinação de antibacterianos e antiparasitários, além de suporte clínico conforme os sinais apresentados. Para todo o processo, o acompanhamento veterinário é fundamental.
Toxoplasmose em humanos: e as gestantes?
Um dos maiores medos envolvendo a toxoplasmose é a contaminação durante a gravidez. De fato, quando uma mulher contrai a doença pela primeira vez durante a gestação, existe risco para o feto. Mas esse risco pode ser facilmente controlado com exames pré-natais (IgM e IgG para toxoplasmose).
O mais grave é que, por falta de informação, muitos médicos ainda recomendam o afastamento ou o abandono do gato. Entretanto, isso é desnecessário, pois com higiene básica (luvas, lavagem das mãos, limpeza da caixa de areia diariamente) e monitoramento médico, é perfeitamente seguro conviver com gatos durante a gravidez.
A Sociedade Brasileira de Infectologia e o Ministério da Saúde têm cartilhas orientando sobre isso, reforçando que o abandono de gatos não previne toxoplasmose.
Como prevenir a toxoplasmose
Prevenir é sempre o melhor remédio. Por isso, veja o que você pode fazer para proteger seu gato e sua família:
- Ofereça sempre ração de qualidade e evite carne crua
- Não permita que o gato cace roedores ou pássaros
- Mantenha a caixa de areia limpa diariamente
- Lave bem as mãos após o manuseio de fezes
- Lave frutas e verduras com cuidado
- Cozinhe bem todas as carnes
- Realize check-ups veterinários regularmente
A toxoplasmose é uma doença importante, mas que não pode mais ser motivo para abandono de gatos. Isso porque a ciência já mostrou que a transmissão via felinos é possível, mas rara, e facilmente evitável com hábitos simples de higiene.
Na SOS Peludos, combatemos o abandono com informação. Nosso compromisso é cuidar da saúde dos animais e também ajudar os tutores a tomar decisões conscientes, seguras e baseadas em evidência.
Se você tem dúvidas sobre toxoplasmose ou quer realizar exames preventivos em seu pet, conte com nossa equipe 24h.
Fontes:
- Dubey, J.P. Toxoplasmosis of Animals and Humans. 2016.
- CDC – Centers for Disease Control and Prevention. www.cdc.gov/parasites/toxoplasmosis
- WHO. Toxoplasmosis Fact Sheet, 2022.
- Hill, D. & Dubey, J.P. Clin Microbiol Infect. 2002.
- Sociedade Brasileira de Infectologia. Cartilha Toxoplasmose e Gravidez, 2021.